Guia para ajudar a resolver temas burocráticos em momentos emocionalmente delicados.
Photo by Sergiu Vălenaș on Unsplash
Autor:Redação
29 janeiro 2021, 6:40
A Covid-19 já provocou milhares de vítimas mortais em Portugal e, a par da dor emocional, muitas famílias têm de lidar com a gestão do património que herdam com as perdas. Para ajudar a que este momento seja menos complicado, e contribuir para evitar que seja fonte de conflito ou um passo para a ruína, apresentamos um roteiro sobre como gerir heranças e tratar da venda de imóveis herdados, em dez passos.
“Depois do luto, de enxugadas as lágrimas, é tempo de tomar decisões”, tal como diz o advogado Ricardo Matos Fernandes neste artigo, preparado para o idealista/news, que “pretende ajudar aqueles que vivem esse momento, e pretende ser um caminho possível no sentido de uma solução boa e acertada”.
1.º Passo
Habilitar-se como herdeiro e a definição de quem exerce as funções de cabeça-de-casal. Esse é um processo relativamente simples. Dirige-te a uma conservatória do registo civil ou a um cartório notarial, e aí vão indicar-te todos os passos que deves seguir. Com a habilitação de herdeiros, habilitando-o como herdeiro, poderás aceder a informação sobre os bens que pertencem à herança, junto de conservatórias, notários, finanças, bancos ou outras instituições. Procura informação completa no site https://justica.gov.pt/Servicos/Espaco-Obito-Backoffice/Habilitacao-de-H…. Se não tiveres disponibilidade, de tempo ou anímica, ou sinta muitas dificuldades em tratar destes assuntos, recorre a um profissional, advogado ou solicitador.
2.º Passo
O tempo não para e, para efeitos do Imposto do Selo (IS) os bens da herança, devem ser declarados junto da secção “Património” do Serviço de Finanças, até ao final do 3º mês seguinte àquele em que ocorreu a morte. Faz-te acompanhar da certidão de óbito e os documentos de identificação da pessoa falecida e de cada um dos herdeiros. Caso tenha deixado testamento ou escritura de doação, estes terão de ser também apresentados. Prepara uma relação dos bens com identificação do artigo matricial e o valor de cada um dos bens, vai ajudar a elaborar o processo. O site da AT disponibiliza os modelos e instruções para saber como fazer. https://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/apoio_contribuinte/modelos_form…
3.º Passo
Havendo acordo, a partilha pelos herdeiros é realizada nas conservatórias, por documento particular autenticado por advogado ou solicitador, ou ainda num cartório notarial. Não havendo acordo ou qualquer outro caso, terá de correr inventário, nos termos previstos na lei. Confere as soluções disponíveis em https://justica.gov.pt/Servicos/Espaco-Obito-Backoffice/Habilitacao-de-H…
4.º Passo
Fica a saber que, relativamente à casa de morada de família, o cônjuge sobrevivo tem direito de ser encabeçado, do momento da partilha, no direito a continuar a habitá-la, assim como usar o respetivo recheio, compensando os demais co-herdeiros na partilha, se o valor destes bens exceder a sua parte sucessória e meação, se a houver. A título de nota informativa, se viver em casa arrendada, e sendo cônjuge, ou viveu em união de fato ou em economia comum, há mais de um ano, o contrato de arrendamento não caduca, mantendo os seus efeitos, mas o falecimento do titular do contrato deve ser comunicado ao senhorio, com cópia dos documentos comprovativos, no prazo de 3 meses a contar da ocorrência.
5.º Passo
Se, em resultado da partilha, ficou com o imóvel, este é um ativo em que o decurso do tempo tem grande impacto, quer no seu valor, quer nos rendimentos e custos que gera, dependendo do tipo e utilização económica que a cada um poderá ser dado. Vejamos:
- Terrenos rústicos, com culturas agrícolas ou florestais, são imóveis interessantes para quem pretenda e possam manter essas atividades. Geram bens de consumo para o próprio ou para comercializar, e há apoios e subsídios públicos a essas atividades. Porém, para quem não tem essa intenção ou vontade, pondere seriamente alienar rapidamente esses bens. Para além da depreciação decorrente da falta de manutenção das culturas (vinha, olival, amendoal, floresta, etc..), o crescimento das árvores e vegetação espontânea, implica custos com limpeza anual dos terrenos, a qual é, em contexto rural, obrigatória, como forma de prevenção de incêndios até ao dia 15 de março de cada ano, assim como – embora habitualmente baixo -, o correspondente pagamento do imposto municipal sobre imóveis (IMI).
- Terrenos urbanos. Estes são, talvez, aquele ativo que menos pressão impõe na tomada de uma decisão. O decurso do tempo pode favorecer a sua valorização. Podendo, ou não, acarretar custos com a limpeza, nos termos previstos para os rústicos, mas o valor a pagar de IMI poderá ser bem mais elevado, dependendo da capacidade edificativa prevista ou licenciada para o lote ou parcela. Verifique o valor do IMI devido, para não apanhar surpresas.
- Outros edifícios. Se estes estão arrendados, naturalmente que a necessidade de decidir pela venda, não é tão urgente. Porém, tratando-se de prédios devolutos, é importante ter a noção de que, o tempo, implica custos com a manutenção e reparação, ou então a degradação e ruína apoderar-se-ão do seu ativo. Para além dos riscos de causar danos a terceiros, decorrentes do dever de vigilância sobre os mesmos. Acresce ainda o pagamento do IMI que anualmente é devido. Pelo que, é importante tomar decisões sobre o destino destes imóveis.
6.º Passo
Decidindo pela venda, esta pode ser potenciada pela intervenção de um profissional que já tem uma lista de interessados qualificados para o tipo do seu imóvel. O mediador imobiliário. Além de, com a experiência que tem, poder ajudar a ajustar o preço àquele que o mercado está disposto a pagar, designadamente, com a rapidez que pretende que a venda seja feita. E sendo um bom profissional, vai promover e divulgar a proposta de venda a um público mais vasto, recorrendo a boas técnicas comerciais para que o negócio aconteça.
7.º Passo
Garantir a concretização da venda. Se aparecer alguém interessado na venda, garante a concretização desta pela realização de um contrato promessa de compra e venda, com um sinal de valor razoável e que represente um efetivo compromisso. Sem isso, o negócio não tem efetividade. Se ainda não tens um advogado ou solicitador a acompanhar este processo, este é o momento de o fazer para a elaboração deste contrato, e assegurar o cumprimento dos direitos emergentes do contrato.
8.º Passo
A venda é formalizada por escritura, documento particular autenticado ou título “casa pronta”. Qualquer um destes documentos serve, realizados no cartório notarial, por advogado ou solicitador, ou na conservatória do registo predial, respetivamente. Quem, habitualmente, marca e suporta os encargos com este documento, assim como tem de liquidar e pagar os impostos inerentes à transmissão (IMT e IS), é o adquirente. Para participar neste ato, faz-te acompanhar do cartão de cidadão, habilitação de herdeiros, participação de imposto de selo (efetuada no passo 2) e do documento que legitima a sua titularidade sobre o imóvel. Não te esqueças que, não vigorando o regime da separação de bens, apesar de se tratar de bem próprio por ter adquirido por herança, o cônjuge tem que consentir na venda e, por isso, também tem que participar na escritura. Como a aquisição resulta de partilha, esta não tem que estar já inscrita em teu nome no registo predial.
9.º Passo
O registo é o ato seguinte. Também este é um ato que incumbe ao adquirente tratar e suportar os encargos e despesas com a sua realização. Fica a saber que se pretenderes ficar com o imóvel para ti, deverás registá-lo em teu nome. Confere a forma como o poderás fazer em https://justica.gov.pt/Servicos/Espaco-Obito-Backoffice/Habilitacao-de-H….
10.º Passo
A eventual mais valia obtida com a alienação, a qual será declarada aquando da apresentação da declaração do IRS com os demais rendimentos auferido durante o ano fiscal, é tributada em sede daquele imposto sobre o rendimento.
- As mais-valias de um imóvel são calculadas com recurso à fórmula MV = VR - (VA x coef +EV + DAL) em que MV = mais-valia obtida; VR = valor realizado com a venda do imóvel; coef = coeficiente desvalorização da moeda; VA = valor de aquisição do imóvel; EV = encargos com a valorização do imóvel suportadas nos últimos 5 anos; DAL = despesas de alienação do imóvel.
- O valor de aquisição a considerar, tratando-se de uma aquisição gratuita é o valor patrimonial tributário (VPT) constante da matriz nos termos do CIMI à data da transmissão (data do óbito), ou o determinado por avaliação nos casos de prédios omissos ou inscritos sem valor patrimonial.
- Os encargos suportados com a valorização do imóvel referem-se a obras ou investimentos na casa que tenham contribuído para a valorização da mesma, e que as mesmas tenham decorrido nos últimos cinco anos antes da venda do imóvel, e os encargos com a compra e venda, têm a ver, por exemplo, com a fatura da comissão suportada pela intervenção do mediador imobiliário.
- Apurada a mais valia, só metade do seu valor será considerada para efeitos de liquidação do imposto.
“Este é um roteiro possível para, num momento particularmente difícil, caminhar sobre uma solução simples e serena, dando início a um novo ciclo de vida, com estes assuntos bem arrumados e consolidados”, remata o advogado e formador na área das atividades imobiliárias.